Em várias disciplinas artísticas temos regularmente a figura do entretenimento ou da avaliação artística em formato concurso e na sua maioria com os seus melhores executantes, nomeadamente na área da fotografia e do cinema. E porque tal não acontece na música?
O concurso é visto nesta área como algo redutor a que se deve socorrer apenas em início de carreira (e.g. concursos de garagem, concursos que dão oportunidade de atuação em festivais) ou quando se procura um novo ressurgimento junto do público e é assim que grande parte do fenómeno da Eurovisão se forma, a que contribui ainda a disponibilidade media proporcionada (nomeadamente através da TV). Alguns exemplos: Cliff Richard (artista britânico) só conseguiu o estrelato 10 anos após a sua estreia discográfica com uma atuação neste certame; Bonnie Tyler e a banda Blue tentaram chegar a novos públicos com participações no evento; Júlio Iglésias, Abba e Céline Dion procuraram este formato para obterem uma diferenciação junto do público que não teriam de outra forma arriscando permanecer no anonimato mundial se não tivessem ficado sujeitos ao escrutínio de público e júri.
Estas decisões de participações em concursos de música com o passar dos anos tornam-se numa luta pessoal de ego em que é descredibilizador participar nos mesmos mas em que os mesmos poderão dar presença em media, de forma direta ou indireta, que todos procuram. O formato Eurovisão, que em Portugal ganhou novo impacto pela estratégia implementada nos últimos dois anos de chamar artistas e letristas com destaque no panorama musical, chega hoje a mais de 200 milhões de espectadores no mundo inteiro através da entrada dos países do Leste da Europa e mais recentemente da Austrália - e quem pode recusar esta visibilidade?
Salvador Sobral, o nosso herói e que nos trouxe algo irrepetível, e que tem dotes artísticos diferenciadores óbvios, não conseguiria por certo, num tão curto espaço de tempo, ter a projeção e número de seguidores que o evento lhe deu sendo difícil gerir agora o seu lado enquanto produto que permita persistir no tempo per si e não apenas pela Eurovisão - a chamada "dor de crescimento".
Ao assistir à Eurovisão e ao Red Bull Culture Clash (outro evento que coloca ao dispor, exige e mostra a perícia dos seus intervenientes em formato concurso e que possibilita atuações e contribuições artísticas únicas) mostra-se que a música tem também de se submeter à prova até para se saberem gerir expectativas entre artistas, agentes, promotores e imprensa. Afinal isto também interessa!